Meu Corpo é da Minha Própria Conta

Freqüentemente me questiono se as pessoas me vêem como uma muçulmana  fundamentalista terrorista radical, carregando um rifle de assalto AK-47 dentro de meu casaco. Ou pode ser que me vejam como uma garota de pôster das mulheres oprimidas de todo o mundo. Eu não estou bem certa.

Eu atraio toda a gama de olhares estranhos, fixos, e olhadelas disfarçadas. Você vê, eu uso um "hijab", um lenço que cobre minha cabeça, pescoço e garganta. Eu o uso porque sou uma muçulmana que acredita que seu corpo é assunto seu.

Jovens muçulmanas estão restaurando o "hijab", reinterpretando-o à luz de seu propósito original - devolver às mulheres o controle de seus próprios corpos. O Alcorão nos ensina que homens e mulheres são iguais, que os indivíduos não devem ser julgados de acordo com seu sexo, beleza, riqueza ou privilégio. A única coisa que faz uma pessoa melhor que a outra é seu caráter. Apesar disso, as pessoas tem dificuldades em relação a mim. Afinal, eu sou jovem, nascida e educada no Canadá, nível universitário - por que eu faria isto a mim mesma, eles perguntam.

Estranhos falam comigo em inglês em tom alto e lentamente e freqüentemente parecem estar dizendo charadas. Eles educadamente me perguntam se eu gosto de viver no Canadá e se o frio me incomoda. Se eu estou de bom humor, isto pode ser muito divertido. Mas, por que iria eu, uma mulher com todas as vantagens de uma educação norte-americana, de repente, aos 21, querer me cobrir de modo que com o "hijab" e as outras roupas que escolho usar, somente meu rosto e minhas mãos apareçam? Por que isto me dá liberdade.

Mulheres são ensinadas desde a infância que seu valor é proporcional à sua atratividade. Nos sentimos compelidas a perseguir noções abstratas de beleza, entendendo pela metade que tal objetivo é fútil. Quando as mulheres rejeitam esta forma de opressão, elas enfrentam o ridículo e o desprezo. Sejam as mulheres que se recusam a usar maquiagem ou raspar suas pernas, ou expor seus corpos, a sociedade, homens e mulheres, tem problema em lidar com elas.

No mundo ocidental, o "hijab"  passou a simbolizar ou um silêncio forçado ou militância radical inconsciente. Na realidade, não é nem um nem outro. É simplesmente a afirmação da mulher de que o julgamento de seu físico não tem papel a desempenhar na interação social. Usar o "hijab" tem me libertado de uma constante atenção ao meu físico. Porque minha aparência não é objeto de escrutínio público, minha beleza, ou talvez a falta dela, foi removida do campo do que legitimamente pode ser discutido.

Ninguém sabe se meu cabelo está como se eu tivesse acabado de sair de um salão de belezas, se eu ganhei ou não algumas polegadas, ou até mesmo se tenho invisíveis estrias. E porque ninguém sabe, ninguém se importa. O sentimento de que alguém tem que atingir os impossíveis  padrões de beleza estabelecidos pelos homens é cansativo e freqüentemente humilhante. Eu devia saber, passei minha adolescência inteira tentando alcançá-los. Estava no limite bulímico e gastei muito dinheiro que não tinha em poções e loções na esperança de me tornar a próxima Cindy Crawford.

A definição de beleza está em constante mudança; ser atlética é bom - desculpe, atlética é ruim. Quadris estreitos? Ótimo. Quadris estreitos? Péssimo. Mulheres não conseguirão igualdade com o direito de expor seus seios em público, como algumas pessoas gostariam que você acreditasse. Isto apenas faria de nós parte de nossa própria objetificação. A verdadeira igualdade será obtida quando as mulheres não precisarem se expor para atrair atenção e não precisarem defender suas decisões de manter seus corpos para si mesmas.

 

Texto de Naheed Mustafa. Naheed Mustafa é canadense e se graduou com menção honrosa em Ciências Políticas e História na Universidade de Toronto. Atualmente cursa Jornalismo na Universidade Politécnica de Ryerson.

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