Zawaj al-Mut'a (O Casamento do Prazer)

A gradual implementação da orientação islâmica é um dos conceitos básicos e fundamentais sobre os quais o Islã foi construído, para que assim as pessoas fossem preparadas para sua aplicação sem choques ou surpresa. Desse modo a implementação das injunções era menos desgastante.

 

Tal gradação requeria a permissibilidade de certos atos como uma medida temporária para lidar com certas situações e circunstâncias. E tal permissão terminava quando o propósito ao qual serviam não era mais necessário. Quando a lei de Allah foi totalmente revelada, ela permaneceu aplicável até o Dia do Julgamento. Nossa lei divina foi completada com as palavras do Altíssimo: "Hoje eu tornei perfeita para você sua religião, e tornei completo meu favor sobre você, e aceitei para você o Islam como modo de vida." {5:4}. Após a revelação desse nobre verso, não houve mais lugar para modificações ou trocas. Essa gradação na implementação incluiu muitas leis religiosas como aquelas relacionadas com o álcool, as heranças e outras.

Neste texto curto, nós focalizamos o casamento temporário e o que se relaciona com ele em termos de sabedoria prática* que tem faltado às pessoas comuns, a tal ponto que facilitou a disseminação de falsos clamores sobre a lei de Allah, O Altíssimo, mentiras sobre seu Mensageiro, e ódio aos companheiros retos (r.a.a.).

 

O que é o casamento temporário?

É um acordo entre duas partes de um casamento por um tempo determinado. O casamento temporário era um costume das nações orientais, e também era praticado por alguns homens no início do Islã, em suas viagens e missões.

Abdullah Ibn 'Abbas (r.a.a.) disse:

"O casamento temporário existia no começo do Islã. Um homem chega a uma cidade aonde não tem conhecidos, e assim ele se casa por um tempo determinado pela sua permanência na cidade,  e com isso a mulher cuida de suas previsões e prepara seu alimento. Até que foi revelado o versículo: ‘Exceto por suas esposas e aquelas que sua mão direita possui.’" Ibn 'Abbas explicou que qualquer relacionamento além desses é proibido. (narrado por Tirmizy)

Como o casamento temporário era um costume dentre os árabes nos dias da ignorância, não teria sido sábio proibi-lo a não ser gradualmente, como é o modo islâmico de remover costumes pré-islâmicos que não são benéficos para o povo.

Está bem estabelecido que o casamento temporário não é a favor do melhor interesse das pessoas porque leva à perda da prole, usa a mulher para satisfazer à luxúria dos homens e diminui o valor da mulher, que Allah honrou. Por isso o casamento temporário foi proibido.

 

 

A Evidência de sua Ilegalidade

Nós demonstraremos – se Deus assim Permitir – algumas das incontáveis evidências de sua ilegalidade, para que sejam afastadas as acusações malignas que os mal-orientados repetem contra Umar Ibnul Khattab (r.a.a.). Essas pessoas clamam falsamente que foi ele que o proibiu quando era Califa. Seu motivo para essa falsa acusação é o ódio cego por aqueles companheiros do Mensageiro  que o socorreram, apoiaram e auxiliaram.

Allah O Altíssimo diz: "Então, o que quer que vocês desfrutarem delas, dêem-lhes sua recompensa, isso é uma obrigação." {4:24}. Esse é o versículo no qual se baseiam aqueles que defendem o casamento temporário. Eles se baseiam nisso seja por ignorância, seja para enganar os demais, dando um sentido superficial ao versículo sem fazerem referência à sua interpretação, e sem tornar acessível ao público em geral a interpretação correta. O que se segue é a interpretação correta, por diversas fontes respeitadas:

Imam Qurtuby diz no seu comentário sobre esse versículo que o pagamento mencionado no contexto é o dote; ele é chamado recompensa porque é uma gratificação pela contentamento, pelo prazer **. Isso apóia o conceito do dote ser uma recompensa.

 Alhasan, Mujahid, e outros dizem: O significado se reporta ao que você usufruiu de bom das mulheres na sua união pelo casamento apropriado, por isso “dêem-lhes sua recompensa” ou seja, seus dotes.

Ibn Khuwayz Mindad disse: Não existe base e não é permitido usar esse versículo como uma permissão para o casamento temporário, já que o Mensageiro de Allah  nos alertou contra isso e proibiu o casamento temporário segundo as palavras de Allah, O Altíssimo: "Casem-se com elas com a permissão de suas famílias." É natural que o casamento ocorra com a permissão dos pais, em um casamento apropriado que tem um protetor e duas testemunhas  e o casamento temporário não é assim.

 

'A-isha(r.a.a.) disse:

"Foi proibido no Qur'an pelas palavras do Altíssimo: "E aqueles que preservam sua partes íntimas, com exceção de suas esposas e aquelas que sua mão direita possui, então eles não serão repreendidos." {23:5}. O casamento temporário não é considerado um casamento apropriado, e uma esposa não se encaixa na categoria "daquelas que sua mão direita possui ***".

Ibn Katheer diz em seu comentário sobre esse versículo: se você se deleita com elas, dê-lhes seus dotes como o Altíssimo determinou: "dê as mulheres seu dinheiro como um presente" {4:4}. Ele interpretou a generalização nesse versículo como incluindo o casamento temporário, mas com estas palavras: Sem dúvida (o casamento temporário) era permitido no alvorecer do Islam, mas foi proibido logo a seguir.

Ibn Jawzy diz sobre esse versículo: alguns comentadores disseram : “Esse versículo se refere ao casamento temporário, e então foi ab-rogado pelo que o Profeta recebeu quando da proibição do casamento temporário”. Essa interpretação não tem nenhuma base. O Profeta o permitiu e então o proibiu com suas próprias palavras, portanto a proibição substitui a permissibilidade. Quanto ao versículo, ele não toca no assunto do casamento temporário. Ele fala do deleite no casamento apropriado."

Há uma imensa quantidade de ditos do Mensageiro que proíbem o casamento temporário, e alguns Hadiss incluem:

Segundo Sabra Bin Ma'had AlJuhany que disse: “Eu estava com meu primo quando passamos por uma mulher que gostou da minha juventude e do manto que meu companheiro carregava. Assim ela propôs um casamento temporário comigo, tendo o manto como dote. Eu me casei com ela e passei a noite em sua companhia. Na manhã seguinte fui à Mesquita e ouvi o Mensageiro de Allah dizendo: 'Oh povo, eu tinha permitido o casamento temporário, mas agora quem quer que esteja nessa situação, que se afaste dela sem tomar de volta o que lhes deu, pois Allah, O Exaltado e Majestoso,  o proibiu até o dia da ressurreição.' " (narrado por Muslim, Abu Dawoud, Ibn Majah, Nasa`i, e Darimi)

Ali Bin Abi Taleb (r.a.a.) disse que o Mensageiro de Allah proibiu o casamento temporário no dia de Khaybar e também proibiu alimentar-se com a carne de camelos domésticos. (narrado por Bukhary, Muslim, Tirmizy, Ibn Majah, Nasa`i, Tahawy, Shafi'i, Bayhaqy, e Hazimy)

Sufyan Althawry ouviu de Isma'il Bin Umayya que ouviu de Alzahry que ouviu de Alhassan Bin Mohammad que ouviu Ali (r.a.a.) dizer a um homem: "Você é uma pessoa em perdição, pois o Mensageiro de Allah proibiu o casamento temporário e a carne dos camelos domésticos no dia de Khaybar." (narrado por Muslim e Bayhaqy)

Conforme Misdad Bin Masarhad que ouviu de 'AbdulWaress que ouviu de  Isma'il Bin Ummaya que ouviu Alzahry dizer: "Nós estávamos com 'Umar Bin 'Abdul'Aziz e mencionamos o casamento temporário, quando um homem chamado Rabee' Bin Sabra disse a ‘Umar: 'Eu testemunho que de acordo com meu pai, o Mensageiro de Allah o proibiu na peregrinação da despedida.' " (narrado por Abu Dawoud e Imam Ahmad)

De acordo com Abu Huraira (r.a.a.), o Mensageiro de Allah proibiu ou aboliu o casamento temporário, tanto sua união como seu divórcio, período de espera e herança (narrado por DarQutny, Ishaq Bin Rahwiya, e Ibn Habban)

Abu Bakr Bin Hafs relatou que ouviu Ibn 'Umar dizer: "Quando Ali recebeu o Califado, ele agradeceu Allah, O Altíssimo, e O louvou e disse: 'Oh povo, o Mensageiro de Allah permitiu o casamento temporário três vezes e depois o proibiu. Eu juro por Allah, e estou pronto a cumprir meu juramento, que se eu encontrar alguém engajado em um casamento temporário sem tê-lo ratificado com o casamento apropriado, eu o farei levar 100 chibatadas a não ser que ele traga duas testemunhas que provem que o Mensageiro o permitiu depois de tê-lo proibido definitivamente.' " (Ibn Majah)

Imam Muslim narrou segundo Mohammad Bin 'Abdullah Bin Numayr que disse:

"Meu pai nos relatou o que ouviu de 'Ubaidullah que ouviu de  Ibn Shahab, que ouviu de Alhassan e 'Abdullah, os filhos de Mohammad Bin 'Ali, que ouviram de seu pai, que ouviu de 'Ali (r.a.a.) que Ibn 'Abbas (r.a.a.) estava sendo brando em relação ao casamento temporário, e por isso ele disse, 'um momento, Ibn 'Abbas, o Mensageiro de Allah o proibiu no dia de Khaybar, quando ele também proibiu a carne dos camelos domésticos.' "

Essas evidências ilustram a retidão do consenso sobre sua proibição. Particularmente como  'Umar Ibnul Khattab (r.a.a.) mencionou sua proibição no púlpito e estabeleceu sua punição, e relembrou a congregação que o Mensageiro de Allah o havia proibido e alertado enfaticamente contra sua prática, e isso em frente a ambos, migrantes e auxiliadores. E ninguém discordou ou argumentou contra, com todo o cuidado e atenção que tinham em ver a verdade sempre revelada, e qualquer erro corrigido, como costumavam fazer com todos os assuntos. Além disso, a proibição foi relatada por um grande número de outros companheiros, além de 'Umar.

Sua proibição foi relatada por 'Ali Bin Abi Taleb, 'Abdullah Bin 'Umar, 'Abdullah Bin Mas'ud, 'Abdullah Bin Alzubayr e 'Abdullah Bin 'Abbas, que confirmou a proibição ao ser relembrado pelo relato dos demais. Esse também é o entendimento dos seguidores, estudiosos e todos os Imams. São unânimes sobre o assunto.

Para rematar a pesquisa, abaixo estão as opiniões dos quatro Imams; para que não reste nenhuma desculpa.

 

Hanafi Mazhab:

 

Declara no Fathul Qadir que o casamento temporário é nulo, e define-se o casamento temporário como aquele em que o homem diz à mulher que terá prazer com ela tantas vezes, por uma determinada quantia em dinheiro. Também é dito no Al-Hashia, após a definição dos dois tipos de casamento temporário, que esse é um contrato com uma mulher que é estipulado com a intenção de não prover segurança ou sustento para uma possível criança; ao contrário, é por um período fixado, e o casamento termina com o fim do período, ou sem período fixado, com o homem ficando com a esposa até decidir deixá-la, e então o contrato termina.

 

Shafi'i Mazhab:

 

O casamento temporário é aquele estabelecido por um período, de modo que se for pedido a um guardião que case sua protegida por um mês, esse será um casamento nulo.

 

Maliki Mazhab:

 

O casamento temporário é aquele com duração determinada, como quando se pede a um guardião que permita que se case com sua protegida por um mês mediante uma quantia; e mesmo havendo acordo o casamento é nulo, e ambos os envolvidos estarão sujeitos a uma pena. Tal casamento é desfeito sem divórcio, tenha ou não sido consumado.

 

Hanbali Mazhab:

 

O casamento temporário é um casamento por um tempo determinado ou não, e não faz diferença se é denominado casamento ou não, ou se o homem pede à mulher permissão para usufruí-la e ela diz que se dá para ele, sem um guardião ou duas testemunhas. O casamento temporário tem duas formas. Uma com final determinado e com a presença do guardião e duas testemunhas, e outra chamada prazerosa (enjoyment) que não tem a presença do guardião ou de testemunhas. Ambos os casos são inválidos.

 

Após a opinião dos quatro Mazahib, nós relacionamos abaixo as opiniões de estudiosos de outras Mazahib.

 

Ibn Hazm disse: "O casamento temporário não é permitido; esse é um casamento de prazo fixado que era permitido durante o tempo do Mensageiro, mas Allah o proibiu através de Seu Mensageiro até o dia da ressurreição."

 

Imam Shawkany disse: "Nossa adoração é de acordo com o que aprendemos do Mensageiro, e temos certeza da autenticidade de sua eterna proibição do casamento temporário. O fato de alguns companheiros não saberem disso não nega o grande número de companheiros que sabiam e que agiram segundo a proibição e a proclamaram."

 

Qady 'Ayyad disse: "Os estudiosos chegaram a um consenso de que o casamento temporário foi um tipo de casamento por tempo pré-determinado, sem herança, com a separação ao fim do tempo acordado sem possibilidade de disputa; e que foi proibido de acordo com a maioria dos estudiosos. Ibn 'Abbas o permitiu até que ele tomou consciência da proibição e então a endossou dizendo: "Se ocorrer agora, o casamento temporário é inválido, independente de ter sido consumado ou não."

 

Imam Nawawy disse: "A verdade sobre o assunto é que foi permitido e depois proibido em duas ocasiões. Foi permitido antes de Khaybar, e então proibido; novamente permitido no dia da liberação, o dia de Awtas, e novamente proibido para sempre depois de três dias do evento."

 

Imam Bayhaqi disse: "Imam Ja'far Bin Mohammad foi pergntado sobre o casamento temporário e disse: 'É adultério.’”

 

Antes de terminarmos essa pesquisa, vamos repetir as palavras do Imam Alfakhr Al-Razy em resposta àqueles que clamam que 'Umar acrescentou a proibição do casamento temporário por si mesmo. E com isso eles o declaram um apóstata e atribuem apostasia a todos que não o impediram: "Tudo isso está errado. O que resta dizer é que o casamento temporário foi permitido durante o tempo do Mensageiro, e eu o proíbo com o que chegou autenticamente até mim comprovando que o Mensageiro de Allah o proibiu."

 

Desse modo vemos como o Islã tratou a questão do casamento temporário e como ele foi proibido até o dia da ressurreição, conforme nos chegou até os Ahadiss autênticos. Não há dúvida de que a reflexão a respeito desta breve mensagem levará à conclusão de que o casamento temporário é proibido para aqueles que crêem em Allah e estão livres da lealdade cega. Nós suplicamos a Allah, O Altíssimo, que nos faça daqueles que ouvem Suas palavras e seguem-nas do melhor modo.

 

 

 

* Bom senso. [N.do T.]

 

** Enjoyment”; a palavra “ joy ” tem um significado mais leve e alegre e menos físico que a palavra “ prazer ”. [N.do T.]

 

*** “ Aquelas que sua mão direita possui ” são as cativas daquela época do início do Islam e não têm absolutamente nenhuma similaridade com qualquer trabalhadora assalariada, por mais humilde que seja.

 A questão da escravidão foi outro problema solucionado pelo Islã por etapas, para que os ex-cativos e cativas pudessem encontrar amparo e viver com dignidade. Foi muito diferente do final da escravidão em países como EUA e Brasil, em que milhares e milhares de homens, mulheres e crianças foram lançados à “liberdade” sem nenhum tipo de apoio ou compensação, formando um grupo marginalizado e à mercê de qualquer oferta de trabalho. [N.do T.]

 

Tradução: Irmã Mariam Polga

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