Trinta e três lições da surata Yusuf
As-Shaykh Abdurahmaan Ibn Naasir As-Sa’dee declara em seu tafsir “Tayseer Al-Kareem Ar-Rahmaan” (pg. 408 - 412) referindo-se ao ultimo versículo da surata em que Allah subhanahu wa ta’la diz “Na verdade, em suas estórias há uma lição para os homens de compreensão”.
Esta estória provém da melhor das estórias porque se refere às várias fases da vida; da provação à tribulação, do ser testado ao ser abençoado, da humilhação à grandeza, da escravidão à realeza, da divisão à unidade, da dor à alegria, do supérfluo à fome, da fome à abundância, das dificuldades ao conforto, e da negação à afirmação. Portanto, abençoado seja Aquele que a revelou da melhor forma possível.
Dentre as lições que podemos tirar desta surata estão:
1. Saber interpretar os sonhos é um ramo muito importante do conhecimento que Allah concede, dentre Seus servos, àquele que O satisfaz. E muitos deles (sonhos) são baseados em símbolos que são ambíguos no sentido e na descrição. Pois, na verdade, a importância do sol, da lua e das estrelas curvando-se para Yusuf é porque tais luzes são a beleza do céu e delas emanam o benefício. Da mesma forma, os profetas e os estudiosos são a beleza desta terra e por eles a humanidade é guiada através da escuridão assim como faz a luz das estrelas do sol e da lua. Além do mais, uma vez que a fonte desta luz é sua mãe e pai, por isso é muito conveniente que a lua e o sol simbolizem seus pais porque deles emana a luz maior da qual ele e seus irmãos descendem. Portanto, o sol, que é um substantivo feminino, simboliza sua mãe e a lua, que é um substantivo masculino, simboliza seu pai e as estrelas seus irmãos.
2. A importância do sonho de seu companheiro de prisão, que o viu espremendo as uvas, é porque, de um modo geral, aquele que realiza tal tarefa é servo de alguém. Assim, ele interpretou que aquele companheiro de prisão deveria ser o servo do rei e isto lhe garantiria sua liberdade da prisão. Com relação ao significado do sonho da pessoa que viu pássaros comendo pão no alto de sua cabeça, Yusuf interpretou este sonho como um indicativo de que ela seria crucificada porque o crânio protege o cérebro e quando a pessoa é crucificada e o corpo é deixado ao relento o cérebro fica exposto e os pássaros o comem.
3. Lá também se encontram evidências da veracidade da missão de Muhammad (que a paz esteja com ele) como profeta pois ele contou ao seu povo esta longa estória e nunca leu qualquer livro e nem aprendeu com qualquer um deles.
4. A pessoa deve se distanciar o máximo possível de situações que a conduzam para uma saída ruim. Também a permissibilidade de não revelar o medo da pessoa poderia prejudicá-la, com base na declaração de Ya’qub a Yusuf: “Ele (o pai) disse: ‘Ó meu filho! Não conte aos seus irmãos a sua visão para que eles não conspirem contra você.’”
5. A permissibilidade de uma pessoa citar alguém como forma de um aconselhamento sincero, algo que não é bom, com base no versículo “para que eles não conspirem contra você.”
6. As bênçãos que Allah concede ao servo não se limitam simplesmente a um indivíduo em particular, ao contrário, são bênçãos que o envolvem e à sua família e aos amigos. E o benefício obtido decorre daquela pessoa, conforme a declaração de Allah: “E assim teu Senhor o escolherá e lhe ensinará a interpretação dos sonhos (e outras coisas) e agraciará com Sua mercê você e a descendência de Ya’qub (Jacó) porque Ele agraciou antes seus pais, Abrão e Ishaque (Isaac), pois Ele é Onisciente e Sapiente”.
7. A importância de ser cauteloso com as conseqüências ruins dos pecados, uma vez que um pecado leva a vários outros. Porque os irmãos de Yusuf tentaram várias conspirações quando quiseram separá-lo de seu pai, mentiram diversas vezes, falsificaram o sangue na camisa, chegaram de noite fingindo que choravam e tudo isto foi o resultado de um único pecado, uma coisa levando a outra.
8. O que realmente importa na vida do servo é um final feliz e não um começo inadequado. Porque os filhos de Ya’qub fizeram o que fizeram no começo, que foi um ato realmente condenável, mas o medo deles acabou por determinar um arrependimento sincero, o perdão integral de Yusuf e do pai e a du’a para que fossem perdoados e recebessem a misericórdia de Allah.
9. Alguns males são menores do que outros e cometer o mal menor é sempre melhor. Porque quando os irmãos de Yusuf concordaram em matá-lo ou atirá-lo no poço um deles disse “Não matem Yusuf (José) mas se tiverem de fazer alguma coisa atirem-no no fundo do poço.” Assim, essa sugestão foi melhor do que a proposta pelos outros irmãos (apesar de ainda ser uma coisa má) e com isso diminuiu a intensidade do pecado cometido por eles.
10.Não há pecado se a pessoa que comprar, vender ou usar qualquer coisa que seja considerada mercadoria de acordo com as regras predominantes de mercado. Pois os irmãos de Yusuf o venderam, o que é haram, transação não permitida, depois ele foi encontrado por uma caravana de pessoas que o levaram para o Egito onde foi vendido como escravo e, apesar disto tudo, Allah se referiu a ele como “mercadoria”.
11.Deve-se tomar cuidado para não ficar isolado com mulheres que podem ser a causa de fitnah, assim como se deve ter cautela com o amor de alguém que pode ser prejudicial. Pois a esposa do rei fez o que fez por causa de sua paixão por Yusuf, que a levou a tentar seduzi-lo, a dizer mentiras sobre ele e a causar sua prisão por um longo tempo.
12.Ele poderia ter desejado aquela mulher, no entanto, resistiu em nome de Allah, o que o aproximou mais de Allah. Porque este tipo de desejo está entre as sugestões maliciosas da alma e é algo que acontece naturalmente à maioria da humanidade. No entanto, o amor e temor de Allah sobrepujaram a tentação para a satisfação dos desejos. Assim, ele está entre aqueles “que temem estar diante de seu Senhor e reprimiu os desejos impuros e a luxúria”. E, também, entre os “sete a quem Allah protegerá com Sua Sombra no Dia do Juízo, quando não haverá outro abrigo senão Sua Sombra: um homem que é seduzido por uma bela mulher e na posição (para a relação sexual ilegal) mas que diz: ‘Temo Allah’”.
13.Sempre que o iman entrar no coração e a pessoa se dedicar com sinceridade a Allah, Ele a defenderá de todos os tipos de males e vulgaridade por causa de seu iman e de sua sinceridade, conforme declaração de Allah: “Assim fizemos para afastá-lo do mal e da obscenidade. Por certo ele era um dos Nossos sinceros servos”.
14.Sempre que o servo vir uma situação que possa levá-lo a fitnah ou ser causa de pecado, ele deve fugir o máximo possível para salvar-se do pecado.
15.Yusuf era dotado de uma beleza interna e externa. Foi sua beleza externa que fez a esposa do rei agir daquela forma e fez com que as outras mulheres ferissem as mãos, enquanto diziam, “Como Allah é Perfeito (ou Valha-nos Deus)! Ele não é deste mundo. Não é senão um anjo nobre.” Sua beleza interna provinha de sua grande castidade e autocontrole apesar dos vários apelos para que pecasse. Por isto a esposa do rei disse “Procurei seduzi-lo mas ele resistiu”.
16.Quando existe uma atmosfera para o pecado, o servo deve sempre recorrer a Allah e distanciar-se de sua própria força e poder, conforme declaração de Yusuf. “Se não afastares de mim as suas conspirações me sentirei inclinado a elas e serei um (daqueles que pecam e merecem censura) dos ignorantes.”
17.Saber e inteligência levam a pessoa a praticar o bem, ao mesmo tempo em que a afasta do mal. Por outro lado, a ignorância incita o ignorante a se submeter aos seus desejos mesmo que isto possa significar sua ruína.
18.Assim como o servo adora Allah nos tempos de bonança, de igual forma ele deve adorá-Lo nas horas difíceis. Pois Yusuf estava sempre invocando Allah, por isso quando ele foi preso continuou a fazer dawah. Ele chamou os dois jovens para o tawhid e os preveniu contra o shirk. Daí que, com sua perspicácia, Yusuf percebeu que eles haviam se sensibilizado com sua dawah pelo que eles lhe disseram “Nós achamos que você é um dos Mushinum (praticante do bem)”. Assim, esta era uma oportunidade de ouro para a dawah. Ele aproveitou para chamá-los para Allah antes de interpretar os seus sonhos para que seu objetivo (chamar para o Islam) fosse mais frutífero. Então, em primeiro lugar, Yusuf esclareceu os dois jovens que tudo o que tinham percebido nele em relação ao caráter nobre e conhecimento profundo era o resultado da crença em Allah e lhes indicava a adoração (tawhid). E ele abandonou o caminho daqueles que não acreditam em Allah e no Juízo Final. Assim, primeiro ele lhes deu dawah por intermédio de suas ações e depois lhes deu dawah por intermédio de suas palavras que mostravam a eles a corrupção do shirk e a realidade do tawhid.
19.A importância das prioridades. Porque quando os dois jovens lhe pediram para interpretar seus sonhos, havia outras questões mais importantes que eles precisavam conhecer antes de terem o pedido atendido. Este é o sinal de um professor dotado de grande inteligência e habilidade para guiar e ensinar corretamente, porque quando os rapazes perguntaram sobre seus sonhos, ele primeiro os chamou para Allah antes da interpretação dos sonhos.
20.Não se considera depender de outros (em lugar de Allah); se acontecer de uma pessoa estar em uma situação difícil e procurar a ajuda de alguém que ela acha que possa aliviar sua situação porque para esta pessoa não há censura se ela agir assim. Isto porque sempre foi um costume das pessoas buscar ajuda entre si em tais questões. Por isso, Yusuf disse àquele que sabia estar a salvo, “Recorda-te de mim ao teu senhor (seu rei, para que me tire da prisão)”.
21.Aquele que ensina deve tentar sempre ser sincero quando ensina e não deve usar seu cargo como meio para obter riqueza, posição ou benefícios pessoais. Além do mais, não deve se negar a transmitir o conhecimento ou dar conselho mesmo que aquele a quem ensina ou aconselha não faça o que ele (professor) pediu. Porque, na verdade, Yusuf (que a paz esteja com ele) aconselhou a um dos jovens que mencionasse sua situação ao rei mas ele se esqueceu de fazê-lo. No entanto, decorrido o tempo e quando o rei precisou de Yusuf, alguém foi enviado a ele. Apesar disto, Yusuf não o puniu por ter esquecido de mencionar sua situação ao rei, pelo contrário, respondeu à pergunta que tinha sido feita.
22.Não há censura para a pessoa que se defende contra uma falsa acusação. Melhor dizendo, é algo louvável. Porque Yusuf recusou-se a deixar a prisão até que sua inocência fosse provada.
23.A interpretação de sonhos é um ramo das ciências islâmicas e a pessoa é recompensada por estudá-la e ensiná-la. A interpretação de sonhos também se encontra na categoria de fatwa porque ele disse aos dois jovens: “Assim é o caso julgado em relação ao que vocês pediram” (tas’taftiyaan – procurou uma fatwa). O rei disse “Explique-me meu sonho (aftoonee – dê-me uma fatwa) e o jovem disse a Yusuf “Explique-nos (aftinaa – dê-nos uma fatwa) o significado (do sonho) das sete vacas gordas.” Portanto, não é permitido interpretar os sonhos senão com o conhecimento (shari’ah).
24.Se a pessoa não for pretensiosa ou desonesta, não deve ser criticada por informar os outros sobre suas qualidades louváveis, desde que com isto ela pretenda trazer um benefício geral, com base na declaração de Yusuf “Confia-me os armazéns do país; eu os guardarei com plena sabedoria.” Da mesma forma, a liderança não é algo que seja censurável se aquele que a detiver cumprir com os direitos de Allah e os direitos de Seus servos no melhor de sua capacidade.
25.Allah é muito generoso com Seus servos, dando-lhes o melhor desta vida e da outra. O meio de se conquistar o melhor da próxima vida é tendo iman e taqwa. O servo deve sempre invocar a Allah por suas recompensas e graças e não deve se desapontar quando vir as pessoas gozando dos prazeres deste mundo dos quais ele seja incapaz de compartilhar. Antes, deve pedir a Allah por Suas grandes recompensas e graças na próxima vida, conforme Sua declaração “E por certo a recompensa da outra vida é preferível para aqueles que acreditam e temem Allah e mantêm suas obrigações para com Ele”.
26.É da sunnah dos profetas hospedar o convidado e tratá-lo condignamente baseado na declaração de Yusuf “Não notaram que eu vos cumulo à medida e que sou o melhor dos anfitriões?”
27.Ter pensamentos negativos sobre alguém nem sempre é proibido desde que acompanhados de provas que amparem a suspeita. Porque, em verdade, Ya’qub disse a seus filhos depois que eles chegaram alegando que um lobo havia comido Yusuf “Qual, vós mesmos criaram uma fábula”. E ele disse, olhando o irmão mais próximo “Posso confiá-lo a vós como anteriormente vos confiei seu irmão (Yusuf)?”
28.Se alguém não quiser que uma outra pessoa saiba de algo que ela tem ou que pretenda fazer, deve usar de meios sutis de distração mas que não contenha qualquer mentira.Como Yusuf fez quando colocou a ânfora de ouro na sacola de seu irmão e depois o retirou levando os outros irmãos a acharem que aquele irmão o tinha roubado. Após o que ele disse “Allah me perdoe, não reteremos senão aquele em cujo poder encontramos nossa ânfora”. Observe-se que ele não disse “Encontramos nossa ânfora com ele” ou “Ele roubou algo que era nosso”. Ao contrário, ele falou de uma forma genérica que poderia se aplicar tanto àquela situação como a outras e não há nada de errado com o que ele fez. Apesar disto, Yusuf fez com que eles achassem que o irmão tinha roubado a ânfora de ouro e assim o irmão mais novo pudesse permanecer com ele, que era o objetivo.
29.Não é permitido a uma pessoa prestar testemunho senão sobre o que ela tiver pleno conhecimento. E esse conhecimento pode advir do fato de ela ter presenciado o fato ou de ter sido informada por alguém confiável, com base no que disseram os irmãos de Yusuf “Não declaramos senão aquilo que sabemos”.
30.A permissibilidade de informar os outros sobre as dificuldades que alguém está passando, enquanto isto não for feito de uma forma que indique que a pessoa está incomodada com o mandamento de Allah, pois os irmãos de Yusuf se queixaram “Ó governante! A miséria se abateu sobre nós e nossa família”. E Yusuf não contestou esta afirmação.
31.Os méritos de taqwa e de sabr (paciência) porque todo benefício nesta vida e na outra é o resultado de taqwa e do sabr, conforme disse Allah “Na verdade, Allah, nos agraciou porque quem teme e é paciente sabe que Allah jamais frustra a recompensa dos Muhsinun (benfeitores)”
32.Aquele a quem Allah abençoou após viver um estado de pobreza ou aflição deve reconhecer a generosidade de Allah sempre se lembrando de sua condição anterior. Assim, ele será capaz de agradecer a Allah toda vez que se lembrar de dos tempos de dificuldade, conforme disse Yusuf (que a paz esteja com ele),”Ele me beneficiou quando me tirou da prisão e ao trazer vocês (todos aqui) do deserto depois de Satanás ter mostrado a discórdia entre mim e meus irmãos”.
33.O servo deve sempre exaltar Allah por ter permitido que permanecesse perseverante no iman, praticando boas ações que fazem com que o iman continue firme. Também deve sempre pedir a Allah para que tenha um final feliz, com o aperfeiçoamento de Sua Graça sobre ele, como base na du’a de Yusuf (que a paz esteja com ele) “Senhor meu! Tu me agraciaste com a soberania e me ensinaste a interpretação dos sonhos; Ó Criador dos céus e da terra! Tu és meu Wali (Protetor, Socorredor, Guardião, etc.) neste mundo e no outro, faze com que eu morra como muçulmano e junta-me aos justos”.
Foi pela vontade de Allah, foi o que Ele me possibilitou falar com relação aos benefícios e lições obtidos desta estória abençoada. Contudo, para aquele que medita, tem a certeza de descobrir outros benefícios advindos da surata além dos acima mencionados. Assim, pedimos a Allah, o mais Elevado, que nos abençoe com o conhecimento benéfico e ações que sejam aceitáveis por Ele, pois Ele é o mais generoso e mais misericordioso.
Shaykh Abdur Rahmaan Naasir Al-Sa`di
“Tayseer Al-Kareem Ar-Rahmaan”
Fonte: sbmrj.org.br