Jovem Muçulmana de São Paulo Defende véu e Poligamia
Manuela Minns, de São Paulo
O islamismo foi utilizado como bandeira pelos seqüestradores que mataram mais de 3 mil pessoas nos atentados de 11 de setembro, nos Estados Unidos.
Mas a apropriação da religião pelos autores dos ataques não impediu que seus princípios continuassem cativando a jovem paulistana Paloma Awada, de 20 anos.
Filha de uma brasileira católica e um libanês muçulmano, aos dez anos de idade ela se decidiu pelo islamismo e pelo uso do véu – que, na visão de muitos não-muçulmanos, é um símbolo de submissão da mulher.
"Usar o véu não é só um ato de fé, é uma questão social", afirma Paloma, estudante de comércio exterior na Universidade Mackenzie. "É o véu que estrutura a sociedade. Ao mesmo tempo que cobre, ele confere um certo pudor à mulher que, na minha concepção, é quem guia a sociedade."
Véus negros
Apesar da imagem negativa que muitos têm dos véus negros, para Paloma eles passam uma sensação de calma e leveza.
"Não o vejo como uma forma de se esconder. Se escondo os meus olhos, eu ainda falo. E eu me represento pelo que falo", diz, segura.
"Aos dez anos decidi que deveria colocar o véu quando terminasse o ginásio. Eu iria mudar de colégio, de colegas, e como ninguém iria me conhecer, a mudança seria mais fácil", lembra Paloma.
Mas a mudança não seria tão fácil. Em 1996, aos 14 anos, ela trocou de escola, mas não cumpriu o combinado por achar que ainda não estava preparada para enfrentar a sociedade.
No final daquele mesmo ano, Paloma foi ao Líbano visitar a família e, no primeiro dia do Ramadã (mês no qual os muçulmanos devem jejuar até o pôr do sol), colocou o véu, presente de uma vizinha muçulmana.
Os mais velhos a apoiaram; os primos jovens, no entanto, ficaram reticentes. Para eles, a decisão poderia ser vista com preconceito no Brasil.
Em casa, os pais foram contra, com medo de que a filha sofresse discriminação social, além dos empecilhos que poderiam surgir no momento de seguir uma carreira.
"Eu sabia que não iria aprender se não passasse por aquele caminho." Na época, muitos colegas deixaram de falar com ela.
Praia
Até hoje, Paloma ouve comentários agressivos quando corre na praia no Espírito Santo, onde sua mãe mora atualmente.
"Já me falaram coisas como: 'Já que veio na praia, tire a roupa'. Quando explico que sou muçulmana, respondem que então eu não deveria ir (à praia)."
Na infância, Paloma não recebeu uma educação religiosa rígida. "Eu só sabia que era muçulmana e não podia comer carne de porco", lembra. Ela teve livre acesso a outras religiões, chegando até a freqüentar igrejas evangélicas com amigas.
Paloma é firme quando diz que a religião não é só fé, mas lógica também. Para embasar suas crenças, ela procura conhecimentos em livros antigos sobre o islamismo, em aulas de religião, filosofia e até nos clássicos da sociologia.
"Pode ser contraditório, mas eu gosto do Karl Marx."
Tabus e submissão
Apesar de viver em uma sociedade ocidental, em que os costumes têm sido liberalizados nas últimas décadas, ela compartilha de muitos costumes islâmicos considerados conservadores.
Como outras muçulmanas, Paloma acredita que antes do casamento não deve haver contato físico entre homem e mulher. Atualmente, ela está noiva de um libanês, muçulmano praticante.
Sobre a poligamia, aceita entre os adeptos de sua religião, Paloma admite que, em determinados casos, ela é providencial. "Se uma amiga perdesse o marido e passasse por dificuldades, eu diria para meu marido se casar com ela para sustentá-la."
Em caso de esterilidade, a religião também aceita uma segunda esposa. "Mas fora esses casos, é luxúria, e eu não compactuo com a luxúria."
Paloma acredita que homens e mulheres têm papéis distintos na sociedade e aceita inclusive a idéia de que a palavra do homem seja mais valorizada.
"Se no Alcorão está escrito que o testemunho da mulher vale a metade do testemunho do homem, eu acato. Não estarei sendo submissa ao homem, mas a Deus."
Paloma é simpática à idéia de uma Guerra Santa, mas não enquadra os atentados de 11 de setembro nessa categoria e diz que os ataques foram um ato de terrorismo absurdo, pois não foram obras de Muçulmanos.
BBC